quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

Reforma vai elevar a carga fiscal, dizem especialistas


MARCOS CÉZARIda Folha de S.Paulo
Se a reforma tributária proposta pelo governo vier a ser aprovada, com o ICMS cobrado ficando para o Estado de destino dos produtos, a carga tributária vai aumentar. Essa é a conclusão a que chegaram especialistas consultados pela Folha ao analisar o projeto de reforma tributária apresentado ontem pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, aos líderes dos partidos da base aliada.
O aumento da carga fiscal ocorreria porque os Estados exportadores líquidos (os que vendem mais do que compram), como São Paulo e Rio Grande do Sul, perderiam receita -o imposto cobrado hoje por esses Estados, na origem, seria perdido para o Estado comprador, o de destino. Já os Estados que compram mais do que vendem terão aumento de receita, porque ficarão com o imposto cobrado no destino.
"A proposta [do governo] é inviável. Não vejo como equacionar o problema da cobrança do ICMS no destino. Haverá desinteresse do Estado produtor. Será um desastre."
A afirmação, em tom negativo, é do advogado Ives Gandra da Silva Martins, professor de direito da Universidade Mackenzie. Ele explica como a carga fiscal aumentaria: o Estado comprador, que terá mais receita (por ser o destino do produto), não vai concordar com a redução das alíquotas (os Estados, por acordo, terão de definir algumas alíquotas para todo o país). Já o Estado vendedor, que perderá receita, vai querer também alíquotas maiores no seu mercado interno (para compensar a perda que terá com a cobrança no destino). Resultado: os consumidores vão pagar a conta.
Para Clóvis Panzarini, consultor tributário e ex-coordenador tributário da Secretaria da Fazenda paulista, não é com reforma que se reduz a carga fiscal. "A carga tributária cai com leis; para isso, basta reduzir as alíquotas, nem é preciso mudar a Constituição."
O advogado Gilberto Luiz do Amaral, presidente do IBPT (Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário), também entende que não é preciso reformar a Constituição para que a carga fiscal seja reduzida.
Ela ressalta que a proposta do governo de desoneração da folha de salários das empresas não é novidade. "Isso já está na Constituição, não é preciso mudá-la.' Ele diz que reduzir a tributação sobre a folha de salários das empresas é bom, mas faz uma ressalva: "Não adianta fazer isso e tributar mais o faturamento. Uma ação anula a outra. Para desonerar a folha de salários, basta uma lei ou mesmo uma medida provisória".
Segundo os especialistas, a aprovação da reforma esbarra em um aspecto de difícil solução: os governadores dos Estados que perderão receita deverão mobilizar suas bancadas federais contra o projeto.
"Os governadores olham o caixa de hoje e não o Brasil de amanhã", diz Panzarini para justificar o que chama de conflitos de interesses de curto prazo (os dos governadores) e de longo prazo (os do Brasil, que poderia crescer mais, por exemplo, com menos taxação sobre os investimentos).
Para Gandra Martins, "tributar no destino perde a razão de ser. Os Estados não vão abrir mão dessa receita. A Zona Franca de Manaus deixaria de existir [por vender tudo o que produz]. É preciso reduzir a carga tributária e a burocracia".

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