domingo, 14 de setembro de 2008

O depósito tributário no lançamento por homologação: a atual posição do STJ.


Simone de Sá Portella[1] O depósito do montante do crédito tributário é em uma faculdade do sujeito passivo, que pretende discutir o débito, com o intuito de suspender a exigibilidade do crédito tributário. Tem natureza jurídica de garantia do crédito. Oferecido o depósito, ao final da lide, se o depositante for sucumbente, dá-se a transformação do depósito em conversão de renda, a favor da Fazenda Pública. Em contrapartida, se o devedor for vencedor na demanda, levantará os valores dados em garantia. A Lei 9.703/98, decorrente da conversão da medida provisória 1.721/98, e regulamentada pelos Decretos 2.850/98 e 2.924/99, disciplina os depósitos judiciais e extrajudiciais de tributos federais. . O depósito do montante integral do crédito tributário é hipótese de suspensão da exigibilidade do crédito tributário, conforme determina o art. 151, II, do CTN. Primeiramente há de se salientar que, para haver a suspensão do crédito tributário, o depósito deve ser no valor integral, pois se for parcial, não há empecilho para a cobrança na via judicial. Nesse sentido, dispõe a Súmula 112, do STJ: “O depósito do montante integral do tributo é o depósito integral em dinheiro do valor que é exigido pelo Fisco”. O art. 156, VI, do CTN, por sua vez, disciplina a conversão do depósito em renda, como hipótese de extinção do crédito tributário. Assim sendo, quando a ação judicial for desfavorável ao contribuinte, o depósito se converte em renda a favor da pessoa jurídica, titular do crédito tributário. Mas para tanto deve se observar o trânsito em julgado. Antes disso, não cabe à Fazenda Pública se apropriar dos valores dados em garantia, pois do contrário haverá lesão ao direito líquido e certo do contribuinte de valer-se da suspensão da exigibilidade do crédito fiscal. Essa exegese possui precedentes no STJ, e decorre da interpretação teleológica do art. 1º, § 3º, II, da Lei 9.703/98. Por outro lado, é defeso ao contribuinte levantar os depósitos antes do encerramento da demanda (art. 1º, § 3º, I, da Lei 9.703/98). No que tange à via processual adequada, a jurisprudência pátria entende que o depósito pode ser pleiteado nos próprios autos da ação principal, sem necessidade de ajuizamento de ação cautelar. No entanto, se for processada ação cautelar, a Fazenda Pública não será condenada em honorários de sucumbência, justamente porque este direito do contribuinte não depende de ação própria[2]. Questão interessante consiste em saber se, no curso da demanda, e feito o depósito, ocorre decadência do direito de a Fazenda Pública efetuar o lançamento, pois se é certo que este suspende a cobrança judicial da dívida, há controvérsia quanto à necessidade de se proceder ao lançamento de ofício, no prazo de 05 anos, para evitar a perda do direito do crédito. Há entendimentos doutrinários de que, nos tributos sujeitos ao lançamento por homologação, se o contribuinte efetua o depósito integral do débito, não há necessidade de constituição do crédito por meio do lançamento, pois o contribuinte já fez a apuração e o recolhimento do valor devido, de modo que houve a substituição do recolhimento, sem se cogitar em decadência, durante o processamento da demanda. Esse é o entendimento de Leandro Paulsen[3] e de Hugo de Brito Machado[4]. Por essa posição, o lançamento só será necessário quando o montante depositado for inferior ao crédito, hipótese em que o Fisco deve se valer do lançamento de ofício. O STJ, tem perfilhado esse entendimento, a partir de precedente da Primeira Seção, no EREsp 898.992/PR, em que foi relator, o Ministro Castro Meira, publicado no DJU de 27/08/07, cuja ementa é a seguinte: “PROCESSO CIVIL E TRIBUTÁRIO. DEPÓSITO DO MONTANTE INTEGRAL. ART. 151, II, DO CTN. SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. CONVERSÃO EM RENDA. DECADÊNCIA. 1. Com o depósito do montante integral tem-se verdadeiro lançamento por homologação. O contribuinte calcula o valor do tributo e substitui o pagamento antecipado pelo depósito, por entender indevida a cobrança. Se a Fazenda aceita como integral o depósito, para fins de suspensão da exigibilidade do crédito, aquiesceu expressa ou tacitamente com o valor indicado pelo contribuinte, o que equivale à homologação fiscal prevista no art. 150, § 4º, do CTN. 2. Uma vez ocorrido o lançamento tácito, encontra-se constituído o crédito tributário, razão pela qual não há mais falar no transcurso do prazo decadencial nem na necessidade de lançamento de ofício das importâncias depositadas. 3. “No lançamento por homologação, o contribuinte, ocorrido o fato gerador, deve calcular e recolher o montante devido, independentemente de provocação. Se, em vez de efetuar o recolhimento simplesmente, resolve questionar judicialmente a obrigação tributária, efetuando o depósito, este faz as vezes do recolhimento, sujeito, porém, à decisão final transitada em julgado. Não há que se dizer que o decurso do prazo decadencial, durante a demanda extinga o crédito tributário, implicando a perda superveniente do objeto da demanda e o direito ao levantamento do depósito. Tal conclusão seria equivocada, pois o depósito, que é predestinado legalmente à conversão em caso de improcedência da demanda, em se tratando de tributo sujeito a lançamento por homologação, equipara-se ao pagamento no que diz respeito ao cumprimento das obrigações do contribuinte, sendo que o decurso do tempo sem lançamento de ofício pela autoridade implica lançamento tácito no montante exato do depósito” (Leandro Paulsen, “Direito Tributário”, Livraria do Advogado, 7ª, ed. P. 1277). 4. Embargos de divergência não providos”. Por este entendimento, o depósito do montante integral, efetuado pelo contribuinte, para suspender a exigibilidade do crédito tributário, além de ter o efeito de conversão em renda, no caso de sucumbência do devedor, dispensa a constituição do crédito pelo lançamento. Entende-se que, o depósito corresponde a um lançamento tácito, posto que, o sujeito passivo procedeu ao cálculo do tributo, e colocou o montante à disposição do Fisco. Assim, o lançamento só será necessário para a cobrança de valor superior ao depositado. Em decisão recente, datada do dia 26/08/2008, a Segunda Turma do STJ, voltou a seguir a diretriz exposta, no REsp 1.042.739-RJ, relator Ministro Castro Meira: “A Turma, por maioria, entendeu que o depósito judicial para suspender a exigibilidade do crédito tributário já o constitui; razão pela qual o lançamento fiscal em relação ao valor depositado é desnecessário. Assim, não há que se falar em decadência do crédito tributário por não ter sido lançado em relação ao crédito discutido pelo Fisco. Precedentes citados: EREsp 898.992-PR, DJ 27/8/2007, e REsp 895.604-SP, DJ 11/04/2008[5]”. Entendemos que tal posicionamento não prejudica o contribuinte, porque a conversão do depósito em renda somente só se dá com o trânsito em julgado da decisão desfavorável ao mesmo. Assim sendo, mesmo com o lançamento implícito, sem se poder falar em decadência, o direito do contribuinte fica ileso, posto que, a execução fiscal tem por pressuposto, a constituição definitiva do crédito tributário, que em regra se dá com o lançamento. Após, não se fala mais em decadência, e sim, em prescrição para a cobrança do crédito fiscal. O depósito judicial do montante integral do crédito suspende a exigibilidade do crédito tributário, razão pela qual, o crédito está constituído, mas a Fazenda Pública fica impedida de ajuizar a execução fiscal, e se já ajuizou, esta fica paralisada. Portanto, não há empecilho para o sujeito passivo discutir o seu pretenso direito na via judicial, seja em sede de embargos à execução, ou, antes da propositura da execução fiscal, por via do mandado de segurança, ou ação anulatória de débito fiscal. Não se pode desconsiderar que, o depósito é uma garantia do crédito, constituída pelo devedor, para fazer valer o seu direito subjetivo de suspender a exigibilidade do crédito tributário. O lançamento por homologação tem como característica a antecipação do pagamento pelo contribuinte, com a prévia apuração do valor devido. Caso o Fisco não se satisfaça, deve proceder ao lançamento de ofício para cobrar eventuais diferenças. Do mesmo modo se procede com o depósito, que embora não seja pagamento, e sim garantia, extingue o crédito tributário quando a demanda é desfavorável ao contribuinte, caso em que se dá a conversão do depósito em renda (art.156, VI, do CTN). Assim sendo, é de todo plausível a tese de que o depósito, nos casos de lançamento por homologação, supre o procedimento do fisco, sem se falar em decadência. Sobre o conceito de lançamento tributário, consultar o nosso artigo; “Lições sobre o Conceito de Lançamento Tributário”, publicado na Revista Jurídica Netlegis[6], em 02/09/2008, e no Boletim da Apet[7], de 04/09/2008. --------------------------------------------------------------------------------
[1] Procuradora do Município de Campos dos Goytacazes/RJ. Especialista em Direito Público pela UNIFLU/FDC. Mestre em Políticas Públicas e Processo pela UNIFLU/FDC. Professora de Direito Constitucional. Autora de diversos artigos. [2] STJ, REsp 122.466/SP, relator Ministro Ari Pargendler. [3] Paulsen, Leandro. Direito Tributário – Constituição e Código Tributário à Luz da Doutrina e da Jurisprudência. Porto Alegre: Livraria do Advogado. 2008. P.1156. [4] Curso de Direito Tributário. São Paulo: Malheiros Editores. 2007. P. 213. [5] Decisão extraída do Informativo nº 365, de 25 a 29 de agosto de 2008; extraído do site www.stj.gov.br; acesso em 04/09/2008.. [6] www.netlegis.com.br [7] www.apet.org.br Simone de Sá Portella

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